Thoreau era um filósofo americano que, entre coisas mais difíceis de
se assimilar assim de repente, numa leitura de jornal, escreveu muitas
coisas que talvez possam nos ajudar a viver de um modo mais inteligente,
mais eficaz, mais bonito, menos angustiado.
Thoreau, por exemplo, desolava-se vendo seus vizinhos só pouparem e
economizarem para um futuro longínquo. Que se pensasse um pouco no
futuro, estava certo. Mas «melhore o momento presente», exclamava. E
acrescentava: «Estamos vivos agora.» E comentava com desgosto:
«Eles ficam juntando tesouros que as traças e a ferrugem irão roer e os
ladrões roubar.»
A mensagem é clara: não sacrifique o dia de hoje pelo de amanhã. Se
você se sente infeliz agora, tome alguma providência agora, pois só na
sequência dos agoras é que você existe. Cada um de nós, aliás, fazendo
um exame de consciência, lembra-se pelo menos de vários agoras que
foram perdidos e que não voltarão mais. Há momentos na vida que o
arrependimento de não ter tido ou não ter sido ou não ter resolvido ou
não ter aceito, há momentos na vida em que o arrependimento é profundo
como uma dor profunda.
Ele queria que fizéssemos agora o que queremos fazer. A vida inteira
Thoreau pregou e praticou a necessidade de fazer agora o que é mais
importante para cada um de nós.
Por exemplo: para os jovens que queriam tornarse escritores mas que
contemporizavam — ou esperando uma inspiração ou se dizendo que não
tinham tempo por causa de estudos ou trabalhos — ele mandava ir agora
para o quarto e começar a escrever.
Impacientava-se também com os que gastam tanto tempo estudando a
vida que nunca chegam a viver. «É só quando esquecemos todos os nossos
conhecimentos que começamos a saber.»
E dizia esta coisa forte que nos enche de coragem: «Por que não
deixamos penetrar a torrente, abrimos os portões e pomos em movimento
toda a nossa engrenagem?» Só em pensar em seguir o seu conselho, sinto
uma corrente de vitalidade percorrer-me o sangue. Agora, meus amigos,
está sendo neste próprio instante.
Thoreau achava que o medo era a causa da ruína dos nossos momentos
presentes. E também as assustadoras opiniões que nós temos de nós
mesmos. Dizia ele: «A opinião pública é uma tirana débil, se comparada à
opinião que temos de nós mesmos.» É verdade: mesmo as pessoas cheias
de segurança aparente julgam-se tão mal que no fundo estão alarmadas. E
isso, na opinião de Thoreau, é grave, pois «o que um homem pensa a
respeito de si mesmo determina, ou melhor, revela seu destino».
E, por mais inesperado que isso seja, ele dizia: tenha pena de si
mesmo. Isso quando se levava uma vida de desespero passivo. Ele então
aconselhava um pouco menos de dureza para com eles próprios. O medo faz,
segundo ele, terse uma covardia desnecessária. Nesse caso
devia-se abrandar o julgamento de si próprio. «Creio», escreveu, «que
podemos confiar em nós mesmos muito mais do que confiamos. A natureza
adaptase tão bem à nossa fraqueza quanto à nossa força.» E repetia mil
vezes aos que complicavam inutilmente as coisas — e quem de nós não
faz isso? —, como eu ia dizendo, ele quase gritava com quem complicava
as coisas: simplifique! simplifique!
Clarice Lispector
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